Janela da Zaki
Antônimos e sinônimos de amor

Antônimos e sinônimos de amor

Camille e Mirelle Costa. Duas irmãs que dividem o quarto e a vida. Camille vive o auge de seus 15 anos, Mirelle vive o limbo entre a infância e a adolescência aos 11 anos. Quase como um quebra-cabeça, as irmãs se completam. Camille é ligada no 220V, fala alto, toma frente e não deixa nenhuma palavra escapar. Mirelle carrega a pureza da infância, tem a fala calma e um olhar curioso de quem está descobrindo viver. 
Com a ponta das madeixas pintadas de rosa pink e sentada em uma cadeira na frente da beliche no quarto das meninas, Mirelle revela que adora sair de casa. “Tipo assim, minha mãe me chama pra ir na casa da minha vó, eu vou. Me chama pra ir na casa da minha tia, eu vou. Me chama pra ir no mercado, eu vou. Qualquer lugar eu vou. Nunca falo não, sempre vou”. “Eu não vejo graça”, retruca Camille.
As irmãs se entreolham e alguns segundos depois, a mais velha confessa: 

                              “Somos muito diferentes e por isso brigamos um pouquinho”.

“Depois (quando estivermos mais velhas), vai perder a graça de ficar brigando toda hora”, acrescenta Mirelle. 
Abrindo a porta da sapateira, Camille dedura que a irmã guarda uma coleção de umas 20 bonecas Monster High, que ganhou de outra menina. E que, mesmo só querendo saber de Tik Tok, no momento, não que doar os brinquedos. Mirelle vive, realmente, a doce confusão em deixar de ser criança para viver a fase em que os hormônios falam mais alto do que o corpo.
Enquanto isso, Camille confessa que, mesmo com o celular novo que ganhou de presente, perdeu o gosto por gravar challenges no Instagram e postar fotos dignas de blogueiras com milhões de seguidores. Ela conta, meio irritada, que no perfil dela que acumula mais de mil seguidores, tem muita gente que está lá só para “ficar de olho” no que ela faz e sequer interage com likes, dirá comentários.
Na Zaki, as duas vivem os momentos doces e amargos da vida. Na doçura encontram a família, as festa de aniversário, os natais e páscoas que deram uma pequena pausa por conta da pandemia. E, claro, os projetos oferecidos para as crianças da comunidade, com um carinho especial pelas aulas de dança.
No sabor amargo, carregam a perda do irmão mais velho. Criado com elas, mas filho apenas do mesmo pai, sofria de depressão e após um surto, acabou deixando a vida. “Antes dele morrer ele tinha falado pra minha mãe: ‘o dia que você separar do meu pai, eu vou morrer’ e, tipo, 2 meses depois (deles se separarem), ele morreu”, lembra Mirelle. 

                   Mirelle carrega, na bagagem, a maturidade de falar sobre o fim da vida.

             Camille lembra, com uma maturidade maior ainda, o quanto isso tudo refletiu em sua                                                        infância e pré-adolescência.

No mesmo período em que perderam o irmão, seus pais se separaram. A caçula não sentiu tanto o abalo por conta da pouca idade, Camille lembra como se fosse ontem do sentimento que tomou conta: “eu achava que ia ficar sozinha”.
Um comportamento explosivo e agressivo adentrou o coração da ruiva de cabelos cacheados. Na escola, tudo era motivo para briga e discussão em alto tom. Os anos passaram e Camille percebeu que suas ações estavam afastando suas amigas. Chegou a hora de mudar. “Eu me toquei que se continuasse (assim), isso ia só estragar as outras pessoas e eu.”
Depois de puxar o cabelo de uma colega, empurrar a outra do banco para cair no chão de pedregulhos e fazer pressão psicológica em uma menina que sofria de incontinência urinária, ela buscou o motivo de tamanha revolta. Ligando os pontos, compreendeu que os acontecimentos com sua família fizeram com que ela adotasse esses comportamentos, que hoje já não andam mais consigo.
“E hoje em dia sabe o que tenho? Tenho trauma dessas coisas. Tenho trauma de gritaria, se alguma pessoa tá gritando já me dá ansiedade. Hoje em dia tenho ansiedade, infelizmente, já começo a tremer, tenho falta de ar…”, conta.
Aos 15 anos, Camille amadureceu na marra dentro da Zaki. Sabe separar o que é bom ou não para si e se descreve como “explosiva quando você mexe no meu caminho. Calma quando tá de boa comigo e eu tô de boa com você”.
Assim, as meninas ilustram a vida de quem vive como antônimos mas carrega no coração o sinônimo mais puro de amor: o de irmãs.
Paulistanas cheias de tipo, mano e meu na ponta da língua carregam no sorriso e na mochila da vida as lembranças de quem nasceu e cresce nos corredores da Zaki.